domingo, 22 de junho de 2014

Toda mulher é meio Carrie Bradshaw. Por Juliana Doretto

A série “Sex and the City” estava no auge, mas eu não estava. Era início dos anos 2000, e, no meio do curso universitário, acreditava que aquelas quatro americanas nada tinham a ver com meu presente nem diziam nada sobre meu futuro.
Mas a história anda, e dez anos depois, redescubro o programa, em madrugadas insones e sem Copa da Mundo na TV portuguesa, defronte à minha tela de 14 polegadas.  E só então entendo de onde veio o sucesso.
As roupas de Carrie Bradshaw ajudam, é claro, mas – infelizmente –, não é com o seu guarda-roupa que me identifiquei. Aos 20, quando o programa era febre, eu acreditava numa regra que até então tinha funcionado em minha vida: “Esforce-se e terá”.
Com isso, eu tinha atingido todos os meus objetivos, que eram modestos, mas me pareciam enormes naqueles anos: a universidade disputada, o primeiro salário, o emprego no jornal. Até nos namoros as coisas iam bem.
Como não ter o casamento perfeito, Charlotte York? “Esforce-se e terá”. Como você pode ficar tanto tempo sozinha, Miranda Hobbes? “Esforce-se e terá”. Como não consegue se adaptar a Paris, Carrie? Já sabe o lema...
Depois de um divórcio (unilateral, e o lado não foi o meu), de uma passagem frustrada pela Europa do leste, de decepções no trabalho, de uma lista de recusas em revistas e congressos acadêmicos – e de muitas sessões de terapia –, eu aprendi que a regra do “Esforce-se e terá” tem seus furos (e eles podem ser mesmo enormes). O que não me fez deixar de insistir no mantra, veja bem. Mas percebo hoje que às vezes não se consegue “ter”, por maior que seja o empenho. E que a vida não se torna menos suportável por conta disso.
Acompanhar as desventuras das quatro amigas virou rotina sagrada, e a cada episódio eu via todas as minhas idiossincrasias nos relatos das americanas. O sonho de Charlotte de se casar novamente, de noiva (quero sim, por que não?); sua vontade de ser mãe (meu relógio biológico faz tique-taque); a reviravolta nos objetivos de Miranda (a carreira é meu norte, mas eu também preciso de todos os outros pontos cardeais); a descoberta do prazer do corpo de Samantha (sim, senhora, tudo tem ficado melhor com a idade...).
Eu não sei como Carrie consegue sustentar seu estilo de vida sendo apenas colunista de um jornal mediano, nem como seu apartamento pequeno pode guardar tantas roupas. Aliás, ninguém precisa de tanta grife. (O que não quer dizer que comprar um par de sapatos de sonho não faça bem. Como me disse uma amiga: “Comprar acalma...”). Mas não é isso que importa. Quero sim uma vida com um pouco de glamour, mas desejo sobretudo o conforto de me saber (e de me dizer) complicada.
Não é uma questão de idade: nem todas as mulheres de 30 mostram suas contradições com certo orgulho, conscientes do drama que é viver. Há gente com 20 que já virou essa chave, e outras com 50 que ainda não a descobriram, e gostam de se vender como se fossem planas como uma dessas TVs que se anunciam em época de Copa. Que gente mais chata...
Eu não gosto do drinque Cosmopolitan (ícone da série), mas sinto uma imensa necessidade de tomar café com amigas e contar meus dilemas, vitórias e desgostos, assim como as protagonistas. Fingir choro, provocando riso. Chorar de verdade, despertando carinho. Fofocar, contar, gargalhar. Eu fazia isso aos 20, mas agora já sei que, com certas amigas, poderei ter esse tipo de conversa a vida inteira. E isso é tão bom...
Texto originalmente publicado em: http://epoca.globo.com/colunas-e-blogs/ruth-de-aquino/noticia/2014/06/toda-mulher-be-meio-carrie-bradshawb-por-juliana-doretto.html


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